“Todos precisamos cultivar a paciência e a humildade.”
Na literatura mundial e nacional há belíssimas páginas referentes ao Natal, considerada a mais importante festa da cristandade. Comemorada anualmente em 25 de dezembro, no Ocidente, esta data foi definida pela Igreja Católica Romana, no terceiro século d.C., como a do nascimento de Jesus. Os países eslavos e os cristãos filiados à Igreja Católica Ortodoxa festejam o Natal em sete de janeiro, pois seguem o calendário Juliano (implantado por Júlio César). As mensagens natalinas espíritas, sobretudo as mediúnicas, constituem um capítulo à parte pelo elevado conteúdo que transmitem.
Entre elas destacamos As Três Orações,1 de autoria do Espírito Irmão X (ou Humberto de Campos), transmitida pela mediunidade de Chico Xavier e que faz parte do livro Cartas e Crônicas, publicado pela FEB, desde 1966.
As Três Orações não se restringe a ser apenas mais uma mensagem que emociona e agrada o leitor de qualquer idade: criança, jovem, idoso. Nela, o Espírito e o médium estabeleceram entre si uma comunhão perfeita de ideias e de sentimentos para, ao final, produzirem uma das mais belas páginas conhecidas de louvor, homenagem e reverência a Jesus, nosso Mestre e Senhor. Quando nos propomos a ler e reler As Três Orações, temos dificuldade em discernir quem se revela maior: o brilhante escritor, domiciliado no além-túmulo, ou o valoroso médium, portador de aguçada sensibilidade mediúnica.
A despeito de ambos, escritor e médium, se apequenarem para revelar a glória do Cristo, não passam despercebidas a correção e a elegância da linguagem utilizada pelo admirável contista e cronista que foi Humberto de Campos, membroda Academia Brasileira de Letras, na última reencarnação. Da mesma forma, Chico Xavier consegue materializar com maestria o pensamento do desencarnado, que o utiliza como medianeiro, fazendo fluir palavras e frases de forma encadeada, dentro de uma sequência harmoniosa de pura simplicidade que nos transporta a um plano mais elevado de vibrações, de serenas e tocantes emoções.
O autor espiritual relata, em As Três Orações, uma breve história que foi contada por “Simão Abileno, instrutor cristão, considerado no Plano Espiritual por mestre do apólogo e da síntese”.2Trata-se, na verdade, de antiga lenda que, em princípio, nos fala do valor da oração e da “resposta do Criador às preces das criaturas”.2 Em linhas gerais, o texto pode ser assim resumido:5
[...] Em grande bosque da Ásia Menor, três árvores ainda jovens pediram a Deus lhes concedesse destinos gloriosos e diferentes. A primeira explicou que aspirava a ser empregada no trono do mais alto soberano da Terra; após ouvi-la, a segunda declarou que desejava ser utilizada na construção do carro que transportasse os tesouros desse rei poderoso, e a terceira, por último, disse então que almejava transformar-se numa torre, nos domínios desse potentado, para indicar o caminho do Céu Depois das preces formuladas, um mensageiro angélico desceu à mata e avisou que o Todo-Misericordioso lhes recebera as rogativas e lhes atenderia às petições.
Decorrido muito tempo, lenhadores invadiram o horto selvagem e as árvores, com grande pesar de todas as plantas circunvizinhas, foram reduzidas a troncos, despidos por mãos cruéis. Arrastadas para fora do ambiente familiar, ainda mesmo com os braços decepados, elas confiaram nas promessas do Supremo Senhor e se deixaram conduzir com paciência e humildade.
Qual não lhes foi, porém, a aflitiva surpresa!... [...]3 As três árvores seguiram destinos distintos:
[...] a primeira caiu sob o poder de um criador de animais que, de imediato, mandou convertê-la num grande cocho destinado à alimentação de carneiros; a segunda foi adquirida por um velho praiano que construía barcos por encomenda; e a terceira foi comprada e recolhida para servir, em momento oportuno, numa cela de malfeitores. [...]3
Ainda que separadas e sofredoras, as três árvores continuaram firmes, confiantes no Senhor.3
[...] No bosque, contudo, as outras plantas tinham perdido a fé no valor da oração, quando, transcorridos muitos anos, vieram a saber que as três árvores haviam obtido as concessões gloriosas solicitadas... A primeira, forrada de panos singelos, recebera Jesus das mãos de Maria de Nazaré, servindo de berço ao Dirigente Mais Alto do mundo; a segunda, trabalhando com pescadores, na forma de uma barca valente e pobre, fora o veículo de que Jesus se utilizou para transmitir sobre as águas muitos dos seus mais belos ensinamentos; e a terceira, convertida apressadamente numa cruz em Jerusalém, seguira com Ele, o Senhor, para o monte e, ali, ereta e valorosa, guardara-lhe o coração torturado, mas repleto de amor no extremo sacrifício, indicando o verdadeiro caminho do Reino celestial...4
Essa singela história nos faz refletir que é preciso não só cultivar a prece e alimentar a fé na Providência Divina. As Três Orações é lição que nos mostra a importância de resgatar a mensagem de amor consubstanciada no Evangelho de Jesus. Para tanto, há necessidade de estabelecermos um programa de vida que objetive conhecer Jesus, seguindo os seus passos. Com Ele aprendemos que uma vida de simplicidade e cultivo de virtudes afasta-nos do fascínio de querer acumular bens materiais, ou permanecer na ilusão de que cargos e posições de destaque, no seio da comunidade onde estamos inseridos, nos conferem status social. Já passa da hora de estabelecermos a diretriz de inserir o Mestre Nazareno nos nossos propósitos existenciais:
E a ninguém, sobre a terra, chameis de vosso Pai; pois vosso Pai Celestial é somente um. Nem sejais chamados “Guias”, porque vosso Guia é somente um, o Cristo. Porém o maior entre vós será o vosso servidor, e aquele que exaltar a si mesmo será diminuído, e aquele que diminuir a si mesmo será exaltado. (Mateus, 23:9 a 11.)
É certo que cada um encontrará, por si mesmo, o caminho de servir a Jesus, mas, como sugestão, podemos começar com o cuidado de evitar a tentação do consumismo desenfreado, tão comum nos dias atuais e, em especial, na época do Natal. Trabalhemos, ao contrário, para acumular outros tipos de bens:
Entesourai para vós tesouros no céu, onde nem a traça nem a corrosão consomem, e onde os ladrões não arrombam nem roubam. (Mateus, 6:20.)6
Por outro lado, algo devemos fazer para minorar a dor do próximo, uma vez que, como espíritas, temos consciência de que “fora da caridade não há salvação”:
[...] Vinde, benditos do meu Pai, herdai o reino preparado para vós desde a fundação do mundo. Pois tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber; era estrangeiro e me acolhestes; {estava} nu e me vestistes; estive enfermo e me visitastes; estava na prisão e viestes a mim. (Mateus, 25:34 a 36.)7
Os laços de família, consanguínea e espiritual, não podem ser descurados, mas fortalecidos. Bezerra de Menezes nos esclarece:
Não se renasce na Terra, sem o concurso dos pais ou dos valores genéticos que forneçam. Não se adquire cultura sem professores ou recursos que eles decidam formar. Não se obtém alimento sem esforço próprio, nem sob o amparo do esforço alheio. [...] Há famílias de ordem material e aquelas outras de ordem espiritual – afirma- nos o Evangelho, na Doutrina Espírita. Atendamos, por isso, ao nosso conceito de família mais ampla. [...] Conduzamos a nossa mensagem de paz e amor a quantos nos partilhem a estrada do dia a dia. [...] Agradeçamos a oportunidade de entender isso e o privilégio de trabalhar por um Mundo Melhor com o nosso Espírito Melhorado, seguindo para a Vida Maior.8
Quanto às provações, vamos enfrentá-las, confiantes na bondade e misericórdia divinas. Aconselha Emmanuel: Carregar nossa cruz, a caminho do Cristo, será abraçar as responsabilidades que nos cabem, no setor de trabalho que ele próprio nos confiou.
E na adesão ao compromisso esposado, urge não esquecer que as nossas dificuldades podem ser modificadas, mas não extintas. [...]
Em quaisquer circunstâncias, cumpre-nos trabalhar, aceitando-nos com as imperfeições que ainda trazemos, realizando o melhor ao nosso alcance, a perceber que sem o conhecimento de nossas próprias fraquezas, tombaríamos no orgulho.
[...] Para nós que aceitamos a jornada para a integração com Jesus, não há possibilidade de recuo, porque a desistência da luta pela vitória do bem significa perturbação e não equilíbrio, rebeldia e não fé.
Em suma, carregar nossa cruz será, desse modo, romper com os milênios de animalidade em que se nos sedimenta a estrutura da alma, principiando por acender as possíveis réstias de luz na selva de nossos próprios instintos, recebendo, pela fidelidade ao serviço, a honra de trabalhar, em Seu Nome, não através de méritos que ainda não possuímos, mas em razão da misericórdia, da pura misericórdia que Ele nos concedeu.9
Referências:
1XAVIER, Francisco C. Cartas e crônicas. Pelo Espírito Irmão X. 13. ed. 3. imp. Rio de Janeiro: FEB, 2012. Cap. 2, p. 15.
2______. ______. p. 13.
3______. ______. p. 14.
4______. ______. p. 14 e 15.
5NOVO TESTAMENTO. Trad. Haroldo Dutra Dias. Brasília: Edicei, 2010. p. 129.
6______. ______. p. 57.
7______. ______. p. 141.
8XAVIER, Francisco C. Bezerra, Chico e você. Pelo Espírito Bezerra de Menezes. São Bernardo do Campo (SP): GEEM, 1973. Cap. 44, Família mais ampla, p. 65-67.
9______. Mãos unidas. Pelo Espírito Emmanuel. 4. ed. Araras (SP): Instituto de Difusão Espírita, 1976. Cap. 48, A Caminho do Cristo, p. 151 a 153.
Fonte: http://www.sistemas.febnet.org.br/reformadoronline/pagina/?id=329